IFFar-SR sedia Seminário de 50 anos do I Simpósio Nacional de Estudos Missioneiros
Reunindo pesquisadores, lideranças Guarani e instituições parceiras, Seminário de 50 anos do I Simpósio Nacional de Estudos Missioneiros debateu memória, território e ancestralidade na região missioneira.

Coral Indígena Guarani Tekoá Pyau, de Santo Ângelo, durante apresentação no Seminário/Créditos: Elisandro Coelho – Assessoria de Relações Públicas
O IFFar realizou, no dia 14 de novembro, no Campus Santa Rosa, o Seminário de 50 anos do I Simpósio Nacional de Estudos Missioneiros. A atividade integrou as comemorações dos 400 anos das Missões Jesuíticas Guarani no Rio Grande do Sul e foi realizada em parceria com a Assembleia Legislativa do estado (ALRS), com apoio da Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS) – Campus Cerro Largo e de integrantes do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros e Indígenas (NEABI) das instituições. O encontro reuniu pesquisadores, lideranças Guarani, estudantes, professores e representantes de entidades da região, com o objetivo de retomar debates sobre memória, território e ancestralidade no contexto missioneiro.
A programação começou com uma Audiência Pública conduzida pelo deputado estadual Jeferson Fernandes, que destacou a necessidade de recolocar o povo Guarani no centro das celebrações dos 400 anos das Missões. Ele lembrou que a região vive um período de intensa programação, mas alertou que muitos eventos ainda deixam de fora aqueles que construíram essa história. O parlamentar ressaltou que compreender o território exige revisitar sua história a partir das experiências que o formam, observando que a data era uma oportunidade de fortalecer a presença das vozes indígenas nas narrativas regionais.
A reitora do IFFar, professora Nídia Heringer, deu as boas-vindas ao público, agradecendo a presença de estudantes, servidores e representantes de diferentes campi e instituições parceiras. Ela destacou a importância de compreender o território para além das divisões político-administrativas atuais. “Às vezes olhamos apenas para a organização política, Santa Rosa, Giruá, Santo Ângelo, mas, muito antes disso, outras formas de vida compuseram essa geografia. Aqui viveram e vivem hoje os povos originários, e compreender essa ancestralidade é fundamental para nós, educadores e estudantes”, pontuou. A reitora também ressaltou o papel das instituições de educação na ampliação do acesso ao conhecimento sobre a história regional e concluiu dizendo que aquele era um dia bastante especial para a instituição, principalmente pela oportunidade de promover aprendizagem e reflexão coletiva.
Após as palavras da reitora, a diretora-geral do Campus Santa Rosa, professora Analice Marchezan, também saudou o público e destacou a importância histórica do evento. Ela enfatizou ainda que, para as instituições de ensino, a temática missioneira é essencial e deve ser tratada não como um simples objeto de estudo, mas como parte constitutiva da formação cidadã e da identidade regional. A diretora agradeceu o trabalho de docentes e núcleos de pesquisa envolvidos na organização e ressaltou a necessidade de contar a história missioneira com a participação das lideranças indígenas. “Não tem como contar esta história sem os povos originários, que a viveram e lutam diariamente para mantê-la viva”, salientou.

Professora Analice Marchezan, diretora-geral do Campus Santa Rosa, durante a abertura do Seminário/Foto: Elisandro Coelho – Assessoria de Relações Públicas
A abertura contou ainda com a apresentação de crianças e jovens do Coral Indígena Guarani da Aldeia Tekoá Pyau, de Santo Ângelo, amplamente celebrada pelo público presente. O coral apresentou um repertório marcado pela espiritualidade, pela conexão com a natureza e pela força da cultura ancestral Guarani, compondo um dos momentos mais marcantes do encontro. Sobre o momento, o deputado Fernandes afirmou que, para os Guarani, espírito e matéria são indissociáveis, e que o canto expressa essa visão integrada do mundo.
No turno da tarde, a primeira mesa retomou o histórico do simpósio realizado em 1975, ainda durante a ditadura militar. O debate reuniu o fundador do evento, Eliezer Moreira Pacheco, referência nacional em educação profissional; o professor Júlio Ricardo Quevedo dos Santos, da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), pesquisador da história missioneira; o professor José Albino Rohr, da Fundação de Integração, Desenvolvimento e Educação do Noroeste do Estado do RS (FIDENE); e o professor Erneldo Schallenberger, da professor da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste), que participou de forma on-line.
Ao revisitar o contexto do primeiro simpósio, Pacheco lembrou que a iniciativa introduziu temas progressistas em um ambiente conservador e ressaltou que a experiência missioneira só pode ser compreendida reconhecendo o protagonismo dos povos indígenas. Quevedo reforçou essa perspectiva ao recordar que, depois daquele encontro, não era mais possível falar apenas em missões jesuíticas, já que as reduções só existiram porque os próprios Guarani aceitaram e conduziram o processo. Rohr e Schallenberger ampliaram o debate ao tratar de questões relacionadas à memória, às fronteiras culturais e aos impactos transnacionais da experiência missioneira.
A mesa seguinte reuniu o professor do IFFar - Campus São Borja, Leandro Goya Fontella e o professor da rede municipal de ensino de Manoel Viana, Max Roberto Pereira Ribeiro, com mediação da professora Maira Eveline Schmitz. Ribeiro apresentou análises sobre a centralidade das mulheres Guarani na continuidade étnica e social após a expulsão dos jesuítas, trazendo dados sobre comunidades estruturadas em torno dessas lideranças. Fontella enfatizou que o território missioneiro ultrapassa as ruínas mais conhecidas e abrange uma ampla área de ocupação Guarani e afirmou que, se um laudo antropológico fosse produzido hoje, evidenciaria que grande parte do atual Rio Grande do Sul é ancestralmente Guarani.
A última mesa do Seminário, e uma das mais aguardadas pelos seminaristas, foi dedicada às cosmovisões dos povos originários, com a participação de lideranças, artistas e intelectuais indígenas Guarani Mbya. Estiveram presentes o professor e líder comunitário Anildo Romeu, da Aldeia Tekoá Pyau, além do cineasta, artesão e ambientalista Ariel Kuaray Ortega e a professora e realizadora audiovisual Patrícia Pará Yxapy, ambos da Aldeia Tekoá Koenju de São Miguel das Missões. A mediação foi conduzida pela professora Bedati Aparecida Finokiet, coordenadora do NEABI da UFFS – Campus Serro Largo.
Patrícia ressaltou que o povo Guarani tem sua própria forma de registrar e transmitir a história, preservada na oralidade e repassada pelos mais velhos, e destacou que é essencial garantir que essa perspectiva seja reconhecida nas narrativas sobre as Missões. Ela lembrou que todo o Rio Grande do Sul é território Guarani e lamentou que, hoje, sua comunidade precise disputar pequenos fragmentos desse espaço, muitas vezes sem condições de manter vivas suas práticas culturais. Também observou que a insistência nesses diálogos é cansativa, mas necessária para que “os dois mundos possam se entender”.
Na sequência, Romeu relatou a falta de autonomia enfrentada mesmo em áreas demarcadas e criticou o preconceito que deslegitima a identidade indígena. Ele comentou que as necessidades da comunidade são frequentemente questionadas e que direitos assegurados por lei muitas vezes não se concretizam na prática. “Somos a prova viva dos nossos antepassados”, disse, pedindo que as falas do povo Guarani não sejam ignoradas.
Ortega completou a reflexão ao abordar a construção histórica que silenciou os povos indígenas. Ele ponderou que a história seria diferente se seus ancestrais tivessem tido voz e denunciou o estereótipo do “índio ideal”, romantizado e imobilizado. Também ressaltou que a mentalidade colonial persiste quando a terra é tratada como negócio e sintetizou dizendo que “a colonização não terminou”.
Ao término do Seminário, o IFFar reafirmou seu compromisso com a preservação da memória missioneira, com a valorização das vozes Guarani e com a promoção de uma educação pública que reconhece a diversidade cultural como fundamento do território. A instituição destacou que seguirá apoiando iniciativas que ampliem o diálogo intercultural e fortaleçam as identidades presentes na região.
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Confira mais fotografias do evento no Flickr do IFFar.
Secom
Redação: Daniele Vieira - estagiária de Jornalismo
Revisão: Rômulo Tondo - Jornalista
Fotografia - Elisandro Coelho - Assessoria de Relações Públicas do Gabinete da Reitora
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